Período: Novembro/2024 | ||||||
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Resumo:
Em decorrência de um ponto controvertido fixado pelo condutor judicial ou arbitral, apresentaremos uma breve análise sobre a importância dos precedentes jurídicos e o planejamento de uma perícia contábil, ou seja, da ação de planejar a perícia para a sua realização em um laboratório de perícia forense-arbitral, em função da importância dos precedentes técnicos e da possiblidade de mudanças no padrão decisório standard aplicado.
E para tal, a título de exemplo, será utilizada uma situação vinculante aplicada às reservas contidas no patrimônio líquido, em relação às demandas de apuração de haveres.
O objetivo deste artigo é demonstrar sucintamente a necessidade de se considerar os precedentes jurídicos, a jurisprudência e os enunciados dos tribunais no planejamento da execução de uma perícia contábil, quando isto for grafado na fixação dos pontos controvertidos, sem que tal fato venha a interferir no direito de ampla defesa e do contraditório. Até porque, nos laboratórios de perícias contábeis forense-arbitrais, surgem os precedentes técnicos científicos, que podem atestar a validade ou a rejeição de uma tese ou de uma contratese.
A título de um exemplo de uma possível mudança da aplicação automática da íntegra dos julgados vinculantes por um juiz monocrático ou por um colegiado julgador, tem-se a inclusão indistintamente de todas as reservas, na apuração de haveres. Exemplo este que tem por objetivo evitar o enriquecimento indevido do sócio retirante pela distribuição oriunda da divisão de todas as reservas, portanto, entre elas, a reserva de contingência; art. 195 e 202 da Lei 6.404/1976; que é um fato totalmente distinto da reserva de capital. Uma vez que, se a avaliação dos haveres deve ser feita com base no patrimônio líquido, nele existe a hipótese de se encontrar dois tipos ou mais tipos de reservas. E a reserva de contingências, art. 195 da Lei 6404/1976, que é aquela que foi criada pela vontade dos sócios, para a formação de um fundo de reserva, com a finalidade de compensar, em exercício futuro, a diminuição do lucro decorrente de perda julgada provável, cujo valor possa ser estimado. Logo, trata-se de um item do PL, contingenciado por estar sujeito à ocorrência ou não, de fato julgado possível. Segue o exemplo do julgado vinculante:
(REsp 130.617⁄AM, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 18⁄10⁄2005, DJ 14⁄11⁄2005, p. 324). Superior Tribunal de Justiça (...) II – O fundo de comércio e o fundo de reserva instituído pela vontade dos sócios integram o patrimônio da sociedade e, por isso, devem ser considerados na apuração dos haveres, por ocasião da dissolução, sem que a sua inclusão caracterize julgamento extra petita.
À luz da ciência da contabilidade, é despicienda e temerária, a inclusão nos haveres de parcela correspondente às reservas de contingências. A conclusão deste signatário, pode ser confirmada ou rejeitada em exames de um laboratório de perícia forense-arbitral.
O plano de trabalho do perito é ação de planejar a perícia. E após avaliar os elementos do processo, litígio, e estando seguro quanto às tarefas, análises técnicas e análises científicas, o perito vai ao planejamento do seu labor, a ser executado no laboratório de perícia forense-arbitral, e focaliza o objeto de verificação, a forma, as técnicas e procedimentos[1] a serem adotados no referido objeto, o método científico a ser empregado, o tempo de trabalho, a divisão das tarefas, a necessidade das citações bibliográficas[2], as pesquisas etc.
Cada quesito não indeferido pelo condutor da lide e ponto controvertido têm sua forma específica de serem observados. O planejamento deve orientar o perito e sua equipe, sobre o que fazer, a fim de que se possa chegar a uma conclusão adequada sobre a veracidade dos atos e fatos alegados, que tem como referente as provas carreadas aos autos.
Realizado o planejamento e estando depositados os honorários periciais, passa-se à execução da perícia, é comunicado aos assistentes e às partes, com antecedência mínima razoável, e prevista no CPC, o início do labor do perito.
É possível que o ponto controvertido de uma demanda seja fixado em decorrência de um enunciado e até mesmo de, um precedente jurídico que deve ser utilizado como elemento para o planejamento do labor do perito.
Um precedente é uma decisão jurídica de um colegiado, desembargadores ou ministros, que é considerado como fonte de direito para casos de disputas judiciais semelhantes, que venham a ocorrer ou ocorreram posteriormente à decisão tida como precedente. Diferencia-se da jurisprudência que representa um conjunto de decisões relativas a um mesmo assunto postulado em juízo. Assim como também se diferencia de um enunciado que é um entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça em julgamentos repetitivos sobre um determinado assunto, sendo este enunciado uma fonte de direito vinculante para os juízes.
Sem embargos à importância de um enunciado ou de uma jurisprudência pacificada, deve o perito considerar que estas fontes referenciais de direito podem ser modificadas ou afastadas, por força do § 4° do art. 927 do CPC/2015, portanto, não são uma verdade absoluta. É importante o fato de que a perícia contábil está adstrita às questões técnicas científicas, inclusive pode criar, se for o caso, um precedente científico contábil, que se representa à luz da literatura especializada[3] e da ciência da contabilidade, pari passu com a teoria pura da contabilidade:
Uma possibilidade (premissa) admitida à luz de um caso estudado em laboratório, cujo núcleo essencial pode servir como diretriz para casos reais. É composto das circunstâncias de experiências que embasam a questão, e tem como tese aspectos essenciais assentados na motivação da epiqueia contabilística. Um precedente, cuja aplicação seja reiterada pode virar inclusive uma regra, a qual passa a orientação de que prevalecerá em casos análogos. Um precedente existe para negar ou dar provimento a uma pesquisa ou estudo. Pode ocorrer que de tão dominante, um precedente científico transforme-se em um fato consuetudinário do escol dos doutrinadores contábeis.
Assim, diante da teoria do precedente científico, dos testes realizados nos laboratórios de perícia forense-arbitral, a função de uma inspeção pericial contábil deve ser reforçada, identificando exatamente as questões de fato que se reputam como essenciais na busca da verdade, justamente porque a fundamentação para a utilização do precedente será a norma geral, um modelo de conduta para as perícias contábeis.
Por força do artigo. 138 do CPC/2015, o juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda, e a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, tida como amicus curiae, amigo da corte, para peticionar com o objetivo de contribuir para a elucidação de possíveis alterações de uma posição vinculante dos tribunais.
Cabe ao perito, diante de um caso em concreto, esclarecer aos julgadores, a distinção entre fundo de reservas, que é um gênero constante do grupo de contas do patrimônio líquido, e os tipos que o constituem, como, por exemplo, a reserva de contingência que tem funções distintas das outras reservas.
3. Considerações finais
O artigo pretendeu demonstrar no campo da verdade contábil científica, à luz do princípio da epiqueia contabilista, os motivos ou as principais razões para que um precedente jurídico, jurisprudência, ou enunciado do tribunal, não venha a prejudicar a ampla defesa e o contraditório técnico. Como exemplo da inclusão de todas as reservas na apuração dos haveres, a reserva de contingência, não deve compor a apuração dos haveres, até que a situação que a criou, seja confirmada ou não, em prestígio à vedação do enriquecimento sem causa.
Um precedente técnico, baseado no conhecimento da ciência da contabilidade e em exames laboratoriais que foi submetido ao contraditório técnico, é deveras importante, para que um tribunal possa embasar a manutenção, ou não, de uma decisão de fatores vinculantes, à luz de um precedente científico contábil, para fins de uma eventual superação do entendimento vinculante anterior, desde que sejam atendidos todos os pressupostos legais.
E por derradeiro, é possível a alteração de tese jurídica adotada em precedentes jurídicos, jurisprudência e enunciados, aplicados em julgamento de casos supostamente repetitivos e análogos, por força da fundamentação adequada e específica a um caso em concreto, à luz da ciência, considerando os princípios da segurança jurídica e da isonomia. É uma decorrência da supremacia da ciência e da existência de distinção entre a questão técnica discutida no processo e o padrão decisório standard aplicado. Portanto, manter decisões contra o conteúdo dos exames laboratoriais forense-arbitrais, é manter uma posição vinculante contrária à ciência.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.
HOOG, Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à Vanguarda. 10. ed. Curitiba: Juruá, 2017.
______. Prova Pericial Contábil – Teoria e Prática. 15. ed., 2018. Juruá
[1] Procedimentos periciais - são os processos técnicos de verificação ou inspeções utilizadas no laboratório de perícia, para a verificação de atos ou fatos patrimoniais. Verificações estas que são realizadas pelos peritos-contadores nas inspeções, que utilizam, além de método científico, várias técnicas, tais como: amostra-testemunha, arbitramento, avaliação, certificação, circularização, exame, impairment, indagação, investigação, mensuração, observação e vistoria, entre outras.
[2] Citações bibliográficas - as citações são referências utilizadas para construir uma reflexão sobre alguma coisa ou em reproduzir ideias, que são referenciadas para sustentar uma hipótese ou reforçar uma ideia, ou lastrear um raciocínio.
[3] HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil. 10. ed. Curitiba: Juruá, 2017. Assim como: HOOG, Wilson A. Z. Prova Pericial Contábil – Teoria e Prática. 15. ed. Curitiba: Juruá, 2018.
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